Fonte: British Library- Luther |
Lutero
rompeu com o ideal humanístico depois do discurso de Erasmo Da Liberdade da Vontade (1524). Erasmo, parecia um aliado à Reforma, pois
tentou evitar que Lutero fosse condenado e de certa forma admirou as 95 teses.
Em 1519 ele envia uma carta para o Cardeal Wosley negando que tenha lido tal documento.
Lutero não nega a razão natural do homem, porém opõe-se à tese humanística de
Erasmo. (Skinner, 1996). O ponto de tensão entre Erasmo e Lutero se dá no fato
das ações decaídas dos homens, nenhum ato pode ser justificado diante de Deus,
e assim contribua para nos salvar. A tensão ocorre, pois Lutero nega a
definição erasmiana de Liberdade da vontade humana capacitando o homem a se
dedicar às coisas que conduzem salvação eterna e Lutero vai contra esse
pensamento afirmando que se somos homens de carne estamos destinados ao pecado.
Lutero chega a concepção de que o homem está destinado a perdição e não há
salvação para ele, pois o ser humano está predestinado a condenação. Devido a
ideia de servidão humana ao pecado Lutero entende a relação entre homem e Deus
sem nenhuma esperança; Há uma contestação as teses tomistas e humanísticas, que
entendiam Deus como um legislador racional, assim a doutrina – tipicamente
luterana- da dupla natureza de Deus. Há o Deus que escolheu revelar-se no
verbo, cuja vontade pode ser “pregada, revelada, oferecida e adorada”, mas há
também o Deus escondido, cuja “vontade imutável, eterna e inescrutável” não
pode ser compreendida pelo homem. (Skinner,1996)
Depois
que Lutero se instalou no mosteiro agostiniano de Erfurt, uma epifania ocorreu
a ele quando lia os salmos, o que mudou sua doutrina e sua forma de ver a
justiça de Deus. Sob a tutela de Johann von Staupita, seu conselheiro
espiritual, Lutero trouxe uma teologia nova, com base na qual ele pode atacar o
papado. Com sua nova teologia, ele foi capaz de expor o conceito de
justificação de forma consistente. Ele se afasta da ideia patrística da
justificação como um processo gradativo de erradicação dos pecados do fiel, mas
vê a justificação como uma consequência imediata “de uma fé que assimila’’,
nessa concepção o pecador é capaz de alcançar a justiça de Cristo por si mesmo,
de modo que ele se torna um com Cristo. O fiel ao mesmo tempo é um simul justus
et peccator – a um só tempo, pecador e justificado. (p.290)
É por meio da graça redentora de
Deus que Lutero consegue resolver o dilema entre o Velho e novo testamento. O
velho testamento ensina o homem a conhecer a si mesmo e a incapacidade de
praticar o bem, enquanto que o novo testamento reconforta o homem, pois a
salvação é alcançada por meio da fé. Essas ideias trazem a luz a teologia
luterana, é por meio de Cristo que o homem alcança a salvação. A teologia de Lutero é uma teologia crucis
(teologia da cruz) no qual sacrifício de Cristo continua sendo chave de nossa
salvação. A igreja para Lutero é algo invisível, constituída dos fiéis e não
uma instituição física. O tratado “Sobre os concílios e a igreja “Lutero
enumera os sinais considerados necessários para distinguir o “povo santo
cristão” de um mero grupo de papistas. No Manifesto 1520, por ele escrito, o
reformador sustenta que todos os crentes e não somente os sacerdotes devem
socorrer os seus irmãos. Todos assumem a responsabilidade por um bem estar
espiritual. Não há necessidade de um intermediário, todos podem se relacionar
com Deus. (Skinner, 1996)
A teologia de Lutero trouxe consigo
implicações políticas importantes. A primeira delas é que ele repudia a ideia
de que a Igreja possui poder de jurisdição, detendo de autoridade para regular
a vida cristã. A venda de indulgências era algo que Lutero não concordava, pois
através desse comércio da fé a igreja afirmava a remissão de pecados dos fiéis.
“[...] Ele chegara à conclusão de
que, se um pecador atinge a fidúcia, será salvo sem a igreja; se não a atinge, nada
que a igreja faça jamais poderá ajudá-lo (Skinner,1996, p294). Em 1521 ele denunciou (O veredito de Martinho
Lutero sobre os votos monásticos) a vida monástica por violar a “liberdade
evangélica”. A vida monástica seria contrária ao censo comum e à razão.
A
igreja genuína não é atingida, pois ela consiste num reino espiritual, mas com
a teologia de Lutero, se cria um “sistema de Igrejas nacionais independentes,
nas quais o príncipe detém o direito de nomear e demitir sacerdotes e bispos
(skinner,1996. p.296).” O papa e o imperador não teriam mais poderes paralelos
e autoridades seculares teriam agora poder de jurisdição. O texto de São Paulo
(início do capitulo da Epístola aos romanos) diz que devemos sujeitarmos às
mais altas potestades, e tratemos os poderes existentes como provindos de Deus.
O texto tornou-se durante a Reforma, o texto mais citado a respeito dos
fundamentos da vida política.
Lutero acreditava que nenhum súdito
deveria se submeter as atitudes ímpias de seus governantes, podendo rejeita-las,
mas devido a revolta camponesa de 1524 ele afirmava que todo homem devia se
submeter às autoridades constituídas. Assim Lutero define princípios condutores
exercendo influencia na nossa história. O Novo testamento, para ele e
principalmente as cartas de São Paulo, trazem a concepção de conduta adequada a
seguir na vida social e política consistindo em plena “submissão do cristão às
autoridades seculares” (Skinner 1996, p. 301)
O Rompimento com Roma: As autoridades seculares e seu papel
Vários
governantes além das autoridades seculares das cidades alemãs decidiram adotar
o fator essencial desse credo político da reforma de Lutero. A proteção de
vários líderes luteranos foi concedida. Frederico I deu continuidade ao que
Cristiano II, imperador dinamarquês fez, permitiu que a Biblía fosse publicada
em vernáculo.
Um fato interessante é que Thomas Cromwell,
um reformista inglês representou um manifesto anticlerical que “provavelmente
ele escrevera em nome da Câmara dos Comuns em 1529 e que, na época, ficara
conhecido como a “Súplica da Câmara dos Comuns contra os Ordinários” (Skinner
1996, p.366 apud.Elton,1951, pp.517,520). O manifesto “adquiriu estatuto de
advertência oficial, sendo entregue pelo rei à assembleia do clero denominada
Convocação, com a solicitação de que essa deliberasse formalmente sobre as
queixas ali contidas (Skinner, 1996, p.366).” Houve consequências e a primeira dela foi uma
Resposta em que as autoridades da Igreja defendiam suas jurisdições tradicionais.
O próprio Rei criticou essa resposta e em 1532, houve a Submissão do Clero, na qual abandonava qualquer pretensão a uma
atividade legislativa independente (Skinner, 1996, p.366 apud.Lehmberg,1970, p.
151-2). O Ato de submissão foi
registrado e no fim de toda essa história o clero foi obrigado a confessar todas
as ordenações “que até o presente foram promulgadas” que pela Convocação tinham
sido “muito prejudiciais às prerrogativas do rei e incompatíveis com as leis e regulamentos
deste Reino” (Skinner 1996, p.366 apud. Elton, 1960, p. 339). Em 1530, durante
a revolução que se deu a constituição de fundamentação teórica e política de
separação entre Estado e Igreja que só mais tarde veio ser oficialmente advogada.
Os governos dos países da Europa, como Dinamarca, Inglaterra, Suécia, etc....
aproveitaram as consequências das campanhas contra os poderes independentes da igreja
para tirarem proveito.
Graças a Thomas Crowell, as jurisdições da
Igreja foram transferidas para Coroa, por causa da aprovação do Ato de
Apelações, proibindo as apelações de Roma. A igreja para ele é uma parte do
corpo político denominada espiritualidade, agora usualmente chamada Igreja da
Inglaterra (Skinner 1996, p.368 apud.Elton,1960, p.344). O que se conclui é que
o rei teria poder supremo para decidir assuntos de caráter espiritual e
temporal. O rei, no caso Henrique VIII tentava ser o líder suprem da Igreja. Com
o Ato de Supremacia o rei foi declarado como chefe da Igreja da Inglaterra, e a
tese do Ato de Sucessão, anterior ao ato de supremacia já mostrava essa ruptura
com o passado como perceberam Thomas Morus e Fisher. Após a declaração do Rei
da Inglaterra como chefe da Igreja, Dinamarca e Suécia também tomaram atitudes
parecidas.
Title page of the Great Bible, sometimes known as 'Cromwell's Bible' Fonte: Britsh Library |
1 - Fonte:https://www.churchofengland.org/about-us/history/detailed-history.aspx
Fonte: SKINNER,Quentin. As fundações do Pensamento político moderno. Companhia das Letras. 728. p, 1996.
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